O intercessor é alguém que cultiva o silêncio "Maria conservava todas estas palavras, meditando-as no seu coração" (Lc. 2, 19).
Uma das mais belas heranças que recebemos de nossa fé é a certeza de que vivemos numa comunhão profunda no corpo de Cristo, que é a Igreja. Somos sustentados pelo amor e pela intercessão uns dos outros. Não só entre nós que estamos ainda peregrinando nesse mundo em direção à Casa do Pai, mas também com aqueles que nos precedem na glória e que já contemplam sua Santa Face e que, por isso, muito mais eficazmente podem interceder por nós. Maria, intercessora, nos ensina a interceder. Maria ocupa um lugar único como intercessora, devido ao seu papel também único na história da salvação; por isso recorremos à sua intercessão. E quantas graças têm sido derramadas sobre nós pela intercessão de nossa doce Mãe. Entretanto, Maria não só intercede por nós, como nos ensina por sua vida a sermos intercessores. Ela é o grande modelo do intercessor. Vejamos algumas características que marcam o perfil do intercessor:
O intercessor é alguém levantado por Deus:
"Não temas, Maria, pois encontraste graça diante de Deus" (Lc. 1, 30). "Vai, porque este homem (Saulo) é para mim um instrumento escolhido..." (At. 9, 15a). "Não fostes vós que me escolhestes, mas eu vos escolhi para que vades e produzais fruto, e o vosso fruto permaneça..." (Jo. 15, 16).
Assim como Deus escolheu Maria, Paulo e tantos outros, a iniciativa no chamado a interceder é do próprio Deus. Ele planta esse desejo no coração do servo como uma semente, mas toda semente precisa brotar e se desenvolver para dar frutos. Muitos cristãos não se tornam intercessores porque não cultivam a semente recebida.
O intercessor é alguém que cultiva o silêncio "Maria conservava todas estas palavras, meditando-as no seu coração" (Lc. 2, 19).
O intercessor cultiva momentos de silêncio orante no seu dia-a-dia para que, mesmo em meio aos seus afazeres, esse espírito de recolhimento esteja em sua alma. Assim, ele estará atento aos sussurros do Espírito em seu interior. O silêncio tem aqui também o sentido de guardar sigilo. Quando o intercessor toma conhecimento direto ou indireto de uma determinada questão, ele guarda isso em seu coração.
O intercessor é alguém que se faz presente "Três dias depois, celebravam-se bodas em Caná da Galiléia, e a mãe de Jesus estava presente" (Jo. 2, 1).
O intercessor não é alheio, ausente ou distante das realidades concretas da vida. Seu mundo é o mundo de Deus e o mundo dos homens. O evangelista quando destaca a presença de Maria, não o faz aleatoriamente. Maria era alguém extremamente próxima da vida de seu povo. Assim, o intercessor participa de todos os momentos de alegria e pujança ao seu redor, como também sabe que as dores da humanidade são suas dores.
O intercessor é alguém que tem os olhos abertos para as situações, muitas vezes não aparentes "Como viesse a faltar vinho, a Mãe de Jesus disse-lhe..." (Jo. 2, 3). Maria certamente percebeu a falta do vinho, antes que os convidados o percebessem. Seu olhar estava atento ao que se passava nos "bastidores" da festa. O intercessor desenvolve, pela ação do Espírito Santo, a sensibilidade diante do que acontece ao redor, mesmo que as pessoas ainda não percebam. Muitas dessas realidades são até mesmo sutis, no campo espiritual e exercem sua influência no campo físico-psíquico-social, como nos alerta São Paulo a respeito da batalha espiritual (cf. Ef. 6, 12; Dn. 10, 7). E o intercessor não só leva a Deus estas situações, mas também procura agir na prática para encaminhá-las.
O intercessor é alguém que fala com Jesus "... a mãe de Jesus disse-lhe: Eles já não têm vinho" (Jo. 2, 3) O intercessor sempre leva a Jesus todas as realidades. Tudo é motivo de oração para ele: tanto de louvor, gratidão, como também de súplica ou entrega. E ele faz isso porque é íntimo de seu Senhor e tudo é nEle, por Ele e para Ele. O "vinho" pode ser concretamente a saúde, o emprego, a falta de paz, os conflitos, as guerras, as dores todas pelas quais passa a humanidade. Sempre haverá alguma situação onde o vinho acabou ou está acabando.
O intercessor é alguém que não teme os aparentes "não" de Deus "Respondeu-lhe Jesus: Mulher, isso compete a nós?..." (Jo. 2, 4).
À primeira vista, a resposta de Jesus foi mal educada e parece até desprezar sua mãe, mas "mulher" aqui é "ishah", a nova mulher (referência ao Gênesis), a nova Eva, não mais infiel e marcada pelo pecado, mas obediente aos planos de Deus. O intercessor não teme um não de Deus, pois mesmo quando Deus diz "não" é em vista de um sim, "porque todas as promessas de Deus são 'sim' em Jesus" (2Cor. 1, 20).
O intercessor é alguém que sabe esperar o tempo de Deus "... Minha hora ainda não chegou" (Jo. 2, 4).
A hora de Deus pode ser agora ou depois. Naquele momento, Jesus realizou o seu primeiro milagre (v. 11), significando a união (bodas) de Deus com seu povo, aliança que seria concluída definitivamente nas Bodas da Cruz. O intercessor não focaliza sua atenção no imediato, como se Deus tivesse que realizar agora (na categoria do tempo) a sua obra. Portanto, sabe que Deus sempre dará uma resposta e crê e espera por essa resposta. Maria seja exemplo da perfeita discípula, suscitando entre nós aqueles que queiram se colocar "na brecha". Mãe da Igreja, rogai por nós
O intercessor é alguém comprometido, antes de tudo, com a Vontade de Deus
"Disse, então, sua mãe aos servidores: 'Fazei tudo o Ele vos disser" (Jo. 2, 5).
Esta é a palavra que Maria está dirigindo continuamente à Igreja: fazei tudo o que meu Filho vos disser! O intercessor está comprometido não com a urgência de uma determinada situação, mas com a Vontade de Deus. Ele não promete a alguém, em nome de Deus, que tudo se resolverá como se espera nem tampouco oferece um consolo vazio e sem sentido. Mais do que palavras, ele oferece sua presença e sabe que a Vontade de Deus é sempre o nosso bem e "que tudo concorre para o bem daqueles que amam a Deus" (Rm. 8, 28). Isso, por vezes, é vivido em meio à dor, como Jesus o viveu em sua agonia (Mt. 26, 36-46).
O intercessor é alguém que tudo coloca diante do Senhor
"Jesus ordena-lhes: 'Enchei as talhas de água'. Eles encheram-nas até em cima" (Jo. 2, 7).
Eles poderiam ter enchido as talhas até um certo ponto, até mesmo por comodismo. Não era o patrão deles que estava mandando e, ainda por cima, cada talha era grande e pesada, quando muito cheia, pois comportava cerca de 100 litros. Se não tivessem enchido até o máximo, teriam perdido uma quantidade considerável de um vinho de altíssima qualidade. O intercessor leva tudo ao coração de seu Mestre. Não é colocar apenas uma parte da vida ou de nossas necessidades e sim o todo. E não é também colocar o que está fora, mas o que está dentro. A vida do intercessor é consagrada a Jesus. Ele deixa que o Senhor comece a obra sobretudo nele mesmo. Por apresentar sua vida inteira, o intercessor prova da excelência do vinho.
O intercessor é alguém que permanece de pé, mesmo diante da dor
"Junto à cruz de Jesus estavam de pé sua mãe, a irmã de sua mãe, Maria, mulher de Cléofas, e Maria Madalena" (Jo. 19, 25).
Quando se enfrenta a dor, aí está o grande desafio e prova para a vida do cristão e, nisso, do intercessor. Ele aprende a transformar a dor em intercessão também. Nessa hora, as palavras podem não existir, mas persiste a postura de permanecer. Jesus mesmo insistiu sobre o permanecer (Jo. 15, 1-8). E é permanecendo nele que os frutos vêm. A dor torna-se assim o grande sacrifício de louvor, oferecido sobre o altar da cruz, como disse Paulo: "Eu vos exorto, pois, irmãos, pelas misericórdias de Deus, a oferecerdes vossos corpos em sacrifício vivo, santo, agradável a Deus: este é o vosso culto espiritual" (Rm. 12, 1).
O intercessor é alguém que vive da esperança e é "memória viva da esperança"
"Quero trazer à memória aquilo que me dá esperança. É graças ao Senhor que não fomos aniquilados, porque não se esgotou sua piedade. Cada manhã ele se manifesta e grande é sua fidelidade. Disse-me a alma: o Senhor é minha partilha, e assim nele confio" (Lam. 3, 21-24).
Maria diante da cruz vive intensamente a dor da perda de seu Filho, mas é alimentada pela esperança que sua fé lhe traz. O intercessor cultiva um espírito de esperança, mesmo diante das situações mais difíceis, pois sua alma contempla as promessas do Senhor. E ainda mais: ele procura ser memória viva de esperança no meio da comunidade cristã e daqueles que sofrem. Alimenta não o que causa desalento, mas o que projeta horizontes de esperança.
O intercessor é alguém que ora e vive como Igreja
"Todos eles perseveravam unanimemente na oração, juntamente com as mulheres, entre elas Maria, mãe de Jesus, e os irmãos dele" (At. 1, 14).
Maria, a cheia do Espírito Santo, estava junto aos discípulos quando Pentecostes aconteceu. Ela que já havia experimentado a plenitude do Espírito, agora intercede pela Igreja que estava para viver seu primeiro Pentecostes. Assim é a presença de Maria junto à Igreja até a volta gloriosa de Jesus: intercedendo para que a Igreja experimente o poder de Pentecostes. O intercessor está no coração da Igreja. Mesmo orando no segredo de seu quarto, ele ora como parte do Corpo de Cristo e com a Igreja. Todas as intenções e necessidades da Igreja são suas necessidades. Mas ele não só ora como Igreja, como também vive profundamente unido à Comunidade de fé, no amor, na oração e na partilha da vida.
Maria seja exemplo da perfeita discípula, suscitando entre nós aqueles que queiram se colocar "na brecha". Nossa Senhora do Rosário, Mãe da Igreja, rogai por nós!
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